CARTA ABERTA DO COORDENADOR DOS CURSOS DO IJEP AOS ALUNOS E INTERESSADOS
Minha pretensão como professor, supervisor e coordenador de cursos de pós-graduação sempre foi fazer com que cada aluno fique totalmente despreparado (sem parar antes da relação de vínculo terapêutico [pré-parou], com prejuízos e preconceitos, em busca de rótulos diagnósticos). Mas, que termine o curso com muita capacitação, disponibilidade e entusiasmo em continuar no caminho da ampliação da consciência, abrindo mão das vaidades, dos vícios e do apego ao ego, reconhecendo sua sombra, para que ela não seja projetada nem domine sua vida. Sempre comento que nossos cursos são um convite para a morte, porque toda evolução exige desenvolvimento, implicando em mudança das crenças limitantes e os condicionamentos, por meio de experiências iniciáticas de morte e renascimento simbólicos! Ou seja, desejo que cada aluno saia transformado e muito nutrido e com disponibilidade para despertar o encontro analítico, nas mais variadas profissões e atividades interpessoais, com o propósito de despertar o melhor do outro. Esta frase de Jung respalda isso que acabei de escrever: "Nós precisamos entender melhor a natureza humana, porque o único perigo real que realmente existe é o próprio homem".
Para nós é muito gratificante, ao final de cada curso, receber depoimentos do quanto que essa jornada foi transformadora e fez a diferença, positiva e virtuosamente, na vida de muitos alunos! Mas, obviamente, como nosso objeto de estudo, pesquisa e ensino é a psique, antes de tudo devemos compreender, pacientemente, que somos nós o objeto de análise! Ou seja, ficamos expostos, mas só assim poderemos estimular e conduzir o outro a se expor. Por isso, a análise e a supervisão do aluno são preponderantes apesar de que, academicamente, não serem obrigatórias! Por isso, o IJEP oferece a possibilidade dos nossos alunos continuarem a especialização ingressando na formação de analista junguiano do IJEP.
Ressalto que os cursos ministrados pelo IJEP são pós-graduações que titulam e formam especialistas e não são cursos de psicologia ou de qualquer outra graduação. Ou seja, nossos alunos já são formados em algum curso superior e, por isso mesmo, tiveram que aprender e refletir a respeito do compromisso, consciente e consequente, das suas profissões, tanto no nível pessoal quanto social, da mesma forma que tiveram que lidar com as questões éticas e implicativas dos seus conhecimentos para, no final, produzir um trabalho monográfico de conclusão de curso. Naturalmente alguns alunos, no final do curso, descobrem o chamado para serem analistas e, neste caso, não é o curso, os títulos, nem todo empenho, pois quem irá determinar isso é o Self e, se essa decisão for legítima, obviamente o universo irá conspirar a favor! Caso contrário nada acontece, como vemos na prática, milhares de profissionais com muitos títulos, batendo cabeça desesperadamente em busca de clientes.
Aliás, outra questão é a nomenclatura paciente. Desde quando comecei a ministrar aulas na graduação, há mais de 40 anos, sempre incentivo os profissionais usarem o termo cliente, pois é uma relação mútua, que envolve um contrato ético e financeiro, onde ambos devem ser ativos e conscientes desse processo intersubjetivo, que leva à intimidade em busca de profundidade, com sigilo e proteção segura de privacidade! Paciente é um termo médico onde o doente espera, paciente e passivamente, a supressão dos sintomas para ter alta. Bem diferente da relação analítica que visa autoconhecimento, autoestima e autonomia. Por isso, a meu ver, nenhum órgão de classe pode interferir neste contrato. Estes, muitas vezes, acabam cerceando a criatividade e a descoberta de novos caminhos e técnicas. Além disso, no que tange as psicoterapias é uma atividade praticada por outros profissionais, porque a psicanálise, a arteterapia, a análise, as terapias do diálogo e do autoconhecimento, o aconselhamento, incluindo o coaching, que é uma espécie de terapia voltada à realização profissional, e a hipnose, entre outras abordagens, podem ser e são praticadas por muitos profissionais que não são psicólogos ou médicos e aí, nestes casos, possuem total liberdade para atuarem, ousarem, criarem e descobrirem novas práticas e caminhos.
A título de ampliação informo que no Brasil a psicologia foi regulamentada como profissão em 1962 e em 1964, com a instalação do regime repressivo do golpe militar, sua base fundante e currículo do curso foram totalmente conspurcados e, infelizmente, até o momento ainda não retomou suas origens primordiais que é preponderantemente a filosofia, seguida da antropologia, sociologia, ciências das religiões, história geopolítica e da arte. Sem esses conhecimentos é praticamente impossível compreender a essência da alma ou psique, com sua angústia em busca de sentido e significado existencial, em meio a todo materialismo e reducionismo científico da contemporaneidade!
Nessa mesma época, com o intuito de controlar a informação e impedir o autoconhecimento e a capacidade crítica e reflexiva, também foi criada a profissão de jornalista. Atualmente, a capacidade de divulgar e propagar o conhecimento e a informação voltou a ser de todo cidadão, obviamente sem desmerecer os jornalistas, que são extremamente importantes para denunciar as iniquidades e contribuir para o aprimoramento político e social da humanidade. Da mesma forma, a capacidade de estimular o autoconhecimento e despertar o curador ferido do outro, apesar da intenção territorialista e da reserva de mercado dos médicos, psicólogos, religiosos, filósofos, administradores de empresas, educadores, pedagogos, entre outras profissões, não é domínio exclusivo de ninguém, pois essa é, a meu ver, a verdadeira missão de cada ser humano que se aproximou da sabedoria do autoconhecimento! Então, resumidamente, quero deixar claro que um verdadeiro analista, antes de tudo, tem que passar pelo processo do autoconhecimento e adquirir muito conhecimento filosófico, antropológico, cultural, artístico e religioso para posteriormente e acima de tudo, como disse Jung: "Depois de conhecer todas as teorias, dominar todas as técnicas, ao tocar uma alma humana, ser apenas outra alma humana".
Finalizo citando um parágrafo escrito pelo Dr. Léon Bonaventure, que está no prólogo do livro "Psiquiatria Junguiana" do Dr. Fierz, escrito em 1996:
"Para exercer este trabalho não se requeria necessariamente que fosse médico, nem psicólogo com formação universitária, pois o conhecimento de si se adquire em primeiro lugar na experiência da vida, confrontando-se com a própria dialética interior de cada um e na relação com os outros. Normalmente um analista experimentado é aquele que adquiriu uma verdadeira ciência da alma através da relação com seu próprio mundo interior. É lá que ele conhece na vida e na verdade o que é alma. Com esta perspectiva se explica porque o Dr. Fierz formou muitos psicoterapeutas, não só médicos e psicólogos, mas também outros profissionais de formação universitária como, por exemplo, pastores de diversas igrejas. O que ele exigia não eram diplomas, pois o hábito não faz o monge, mas cultura, dedicação e certas predisposições naturais que chamaríamos de dons inatos, qualidades humanas, inclusive éticas e, sobretudo, um sentido da alma, do símbolo e da individuação".
Waldemar Magaldi Filho, psicólogo, mestre e doutor em ciências da religião, fundador e coordenador dos cursos de pós-graduação que titulam e formam especialistas em Psicologia Analítica, Psicossomática, Arteterapia e Expressões Criativas do IJEP - Instituto Junguiano de Ensino e Pesquisa - [email protected]